Alcione Montani

No Brasil, milhões de imóveis ainda se encontram em situação irregular, seja por falta de documentação,
disputas de posse ou pela dificuldade de acesso ao sistema judicial. Essa realidade afeta não apenas famílias que desejam
garantir a propriedade de suas moradias, mas também empresas e profissionais do setor imobiliário que enfrentam
obstáculos para regularizar imóveis. Em muitos casos, a única solução viável para a regularização desses bens é o
processo de usucapião, um instrumento jurídico que permite a aquisição da propriedade por meio da posse contínua e
incontestada. Entre as alternativas disponíveis, a usucapião extrajudicial se destaca como uma maneira mais rápida e
acessível de resolver essa questão, permitindo que a regularização aconteça diretamente em cartório, sem a necessidade
de recorrer à Justiça.
Neste artigo, vamos destacar os prazos e requisitos necessários para a sua realização, as modalidades da
usucapião extrajudicial, as principais diferenças em relação à usucapião judicial, e destacar a importância fundamental
dos cartórios de notas e registro de imóveis nesse processo.
Prazos e Requisitos da Usucapião Extrajudicial
A usucapião extrajudicial permite que a regularização da posse de um imóvel ocorra diretamente em cartório,
sem a necessidade de um processo judicial. Essa modalidade foi introduzida pela Lei 13.105/2015 (Novo Código de
Processo Civil) e exige o cumprimento de certos requisitos:
- Posse ininterrupta e sem oposição: O possuidor deve comprovar que exerce a posse de forma contínua
e sem a oposição de terceiros, com o intuito de ser dono do imóvel. - Prazo: Os prazos para usucapião extrajudicial são os mesmos da usucapião judicial, conforme a
modalidade escolhida. Para usucapião ordinária, o prazo é de 10 anos (reduzido para 5 anos em determinadas condições);
para usucapião extraordinária, o prazo é de 15 anos (reduzido para 10 anos); e para as modalidades especiais, o prazo é
de 5 anos. - Documentação: O interessado deve apresentar uma série de documentos, dentre eles a comprovação da
posse, Ata Notarial para fins de usucapião, planta e memorial descritivo do imóvel, e a anuência dos confrontantes
(vizinhos) para a regularização do imóvel. - Ausência de litígio: Não deve haver conflitos ou contestação por parte de outros interessados ou órgãos
públicos.
Modalidades de Usucapião
A usucapião pode ocorrer de várias formas, conforme as condições e características da posse do imóvel. As
principais modalidades de usucapião previstas no Código Civil Brasileiro são: - Usucapião Ordinária: Exige que o possuidor tenha a posse do imóvel por um período contínuo de 10
anos, com a intenção de ser dono, e sem oposição (significa que não há contestação ou resistência por parte do dono da
propriedade). Esse prazo pode ser reduzido para 5 anos quando houver comprovada melhoria no imóvel ou quando ele
for utilizado para moradia. - Usucapião Extraordinária: Não exige que o possuidor tenha título ou boa-fé, apenas que a posse seja
contínua, sem interrupção, por 15 anos. Esse prazo pode ser reduzido para 10 anos se houver a comprovação de
benfeitorias. - Usucapião Especial Urbana: Destinada a imóveis urbanos de até 250 metros quadrados. O prazo é de
5 anos e o possuidor deve utilizá-lo como sua moradia, sem oposição, e não ser proprietário de outro imóvel urbano ou
rural. - Usucapião Especial Rural: Semelhante à usucapião urbana, mas destinada a áreas rurais de até 50
hectares. O prazo é de 5 anos, e o possuidor deve ser trabalhador rural, usando o imóvel para sua moradia ou para o
cultivo. - Usucapião Coletiva: Aplicada a áreas urbanas ocupadas por uma coletividade, como favelas ou bairros
informais. A posse deve ser exercida por um grupo, e o imóvel deve ser destinado à moradia popular. O prazo é de 5
anos.
Diferenças entre Usucapião Judicial e Extrajudicial
Embora a usucapião judicial e a extrajudicial possuam o mesmo objetivo, o reconhecimento da posse como
propriedade legítima, elas se diferem principalmente pelo procedimento:
- Usucapião Judicial: O processo ocorre no Judiciário, o que pode tornar o procedimento mais demorado,
com audiências, custos adicionais e maior complexidade. O juiz decide sobre a validade da posse e a eventual
regularização do imóvel. - Usucapião Extrajudicial: A regularização ocorre diretamente no cartório de Registro de Imóveis, onde
o interessado, representado por advogado, pode protocolar a documentação necessária e realizar todo o procedimento
de forma administrativa. Não há a necessidade de intervenção judicial, tornando o processo muito mais rápido e simples
e, na maioria das vezes mais econômico.
Vantagens da Usucapião Extrajudicial
A usucapião extrajudicial apresenta diversas vantagens sobre a modalidade judicial, destacando-se:
- Rapidez: A usucapião extrajudicial é mais ágil, pois não depende da tramitação judicial. Em muitos
casos, o processo pode ser concluído em poucos meses. - Menor Custo: Os serviços prestados pelos cartórios são tabelados e calculados por faixa de valores e
não percentual, além disso, há um teto, um valor máximo em que é permitida a cobrança pelos serviços em contrapartida,
no Poder Judiciário é por percentual, assim o custo judicial pode ser muito maior. - Facilidade: O procedimento é simplificado, e o interessado pode resolver a questão diretamente em
cartório, sem a necessidade de recorrer ao Judiciário. Em todos os municípios têm cartórios então se torna muito mais
acessível também para se orientar e requerer os serviços. - Segurança: A regularização feita diretamente em cartório proporciona a mesma segurança jurídica que
uma decisão judicial, uma vez que o procedimento é realizado de acordo com as normas legais vigentes, cujos atos são
praticados por Tabeliães e Registradores – profissionais do direito dotados de fé pública – e em sua maioria já aprovados
em concurso público. Além disso, o requerente deverá estar assistido por advogado regularmente inscrito na Ordem dos
Advogados do Brasil – OAB.
O Papel Crucial dos Cartórios
Os cartórios de notas e cartórios de registro de imóveis desempenham um papel fundamental no processo de
usucapião extrajudicial. O cartório de notas é responsável pela elaboração da Ata Notarial para fins de usucapião,
enquanto o cartório de registro de imóveis realiza o processamento do requerimento e, posteriormente, em caso de
deferimento, o registro da usucapião e abertura de nova matrícula para o imóvel usucapido, formalizando a propriedade
do imóvel em nome do usucapiente (aquele que está em vias de adquirir ou adquiriu por usucapião a propriedade de
algo) que passará, a partir de então, a ser proprietário do imóvel.
Esses cartórios asseguram a conformidade do processo com a legislação, garantem que todas as etapas sejam
cumpridas corretamente e oferecem a segurança jurídica necessária para a transação. Além disso, o cartório de registro
de imóveis é responsável por manter a publicidade dos registros, garantindo que terceiros possam consultar a situação
do imóvel, protegendo assim o direito de propriedade.
Em conclusão, a usucapião extrajudicial é uma alternativa prática e eficiente para a regularização de imóveis,
com prazos mais curtos, custos reduzidos e com a mesma segurança jurídica de uma sentença judicial.
Se você é possuidor de um imóvel e deseja regularizá-lo, ou se trabalha na área jurídica ou imobiliária, entender
o funcionamento da usucapião extrajudicial é fundamental para aproveitar todas as vantagens deste instituto jurídico,
que pode render uma boa economia ao possuidor e altos honorários aos profissionais que atuam na regularização de
imóveis.
Alcione Montani Ducceschi Fontes
Tabeliã de Notas e Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais
Especialista em Direito Notarial e Registros Públicos
Instagram: @alcionemontani_tabelia